Sobre os Princípios na programação
SOLID contém 5 princípios de design de software, mas não são todos os princípios existentes. Existem vários:
- SOC Separation of Concerns;
- DRY Don’t Repeat Yourself;
- YAGNI You Ain't Gonna Need It;
- KISS Keep It Simple, Stupid;
- REP The Release Reuse Equivalency Principle;
- CCP The Common Closure Principle;
- CRP The Common Reuse Principle;
- ADP The Acyclic Dependencies Principle;
- SDP The Stable Dependencies Principle;
- SAP The Stable Abstractions Principle;
- entre outros.
Os princípios citados acima não são do SOLID, mas também são princípios de design de software. São tão importantes quanto o SOLID para que o projetista possa saber o que é positivo e o que é negativo.
Não estou dizendo que uns são melhores do que outros, ou impondo uma hierarquia. Afirmo, entretanto, que todos são importantes para formar o conhecimento de um projetista. Saber quais práticas podem trazer benefícios e quais podem trazer desastrosas dores de cabeça conforme um software for evoluindo é a busca de todo bom projetista. Os princípios norteiam para esse conhecimento.
Haja vista que os princípios surgiram por causa de uma necessidade de entregar software de qualidade e em menos tempo possível. Numa época em que os grandes nomes da ciência da computação defendiam que "software deve ser fácil de manter"!
Entendendo que: "menos tempo possível" não significa entregar correndo. Muitos usam a palavra Ágil, afirmando que o software deve ser feito rápido, mas num sentido errado. O sentido da "agilidade" é entregar software de qualidade. Qualidade dá menos trabalho para mudar, menos trabalho para corrigir. Isso resulta em menos custo e menos tempo para manter e evoluir o software.
Como disse o Maniero: "Eu gosto de outros princípios com prioridade, dois deles são o YAGNI e o KISS que pregam que você deva fazer tudo simples e só o que precisa. Claro com algum cuidado para não exagerar. De fato o KISS diz para fazer simples, mas não simplório, e o YAGNI não está dizendo para deixar a aplicação completamente pelada". Os princípios ajudam a fazer bem feito, mas é preciso aprender a evitar exageros.
A experimentação e análise que deu origem aos princípios não foram feitas por programadores acalorados, mas por gente que sabia o que estava falando, gente do âmbito acadêmico (MIT, Oxford, etc) e empresarial de grande importância (IBM, por exemplo). Essa experimentação ocorreu por um período extenso (de mais de 30 anos) de pesquisa, por isso é difícil para nossa geração imediatista entendê-los. Não basta dar Control+C e Control+V.
Boa parte desses princípios surgiram em ambiente científico, em grandes universidades. O LSP do SOLID (Liskov Substitution Principle), por exemplo, foi feito por Barbara Liskov do MIT em uma de suas publicações.
Quando vemos artigos e críticas acirradas em blogs sobre "porque usar ou não usar princípios", percebemos o quão distantes as pessoas estão do real objetivo dessas preciosas ferramentas para projetistas de software. Os princípios existem para prover:
- Facilidade de manutenção;
- Reaproveitamento de código em outros projetos;
- Entregar evoluções e correções o quanto antes.
Veja o Manifesto para Desenvolvimento Ágil de Software.
Outra coisa importante: O objetivo não é seguir a risca todos os princípios a ferro e fogo em todos os momentos!! Se for assim, o software torna-se muito difícil de fazer, principalmente para os programadores menos experientes. Exigências e cumprimentos de regras a todo custo não é o objetivo!! A importância dos princípios é relacionada a conhecimento, permitir que o projetista conheça o que comprovadamente funciona e o que não funciona em diversas situações para que decida, por si mesmo, a melhor maneira de fazer um software que se adeque à realidade de sua empresa.
Sobre o SOLID
De fato, Robert Martin não "criou" os princípios SOLID, mas catalogou vários princípios que, segundo sua experiência, seriam os mais importantes por sintetizarem todos os outros (ver Design Principles and Design Patterns). Em outras palavras, entendendo e cumprindo estes princípios, estaria-se cumprindo, consequentemente os outros existentes na literatura.
Dessa lista, separou 5. No livro Clean Architecture, Martin explica que por volta de 2004 seu amigo Michael Feathers :
“enviou-lhe um e-mail dizendo que, se reorganizasse os princípios de seu catálogo, as primeiras letras soletrariam a palavra SOLID (sólido
em português)”.
Foi neste ponto que nasceu o acrônimo.
Robert Martin levou 20 anos para formular o catálogo, com base em testes e experiência dele e de seus companheiros em diversas linguagens de programação. Não foi uma suposição, foi experimentação conjunta ou referenciada dos trabalhos de vários nomes da engenharia de software e ciência da computação: Barbara Liskov, Bertrand Meyer, David L. Parnas, Dave Thomas, Edsger Dijkstra, Kent Beck, Larry L. Constantine, Alistair Cockburn, Martin Fowler, Andrew Hunt, Michael Feathers e vários outros. Basta procurar alguns desses nomes na internet.
Para o bem da verdade, pouca coisa é do Robert Martin, a maioria dos princípios que ele catalogou é proveniente da literatura de alguns desses nomes. Abaixo, algumas das referências usadas por Martin para sintetizar e nomear os 5 princípios.:
SRP - Princípio da Responsabilidade Única: David L. Parnas e Edsger Dijkstra (autor do SOC Separation of Concerns);
OCP - Princípio Aberto Fechado: Bertrand Meyer e Larry L. Constantine (uns dos primeiros a falar sobre acoplamento e coesão);
LSP - Princípio da Substituição de Liskov: Barbara Liskov;
ISP - Princípio da Segregação de Interfaces: baseado no design pattern Template Method, da Gang of Four (Erich Gamma, Richard Helm, Ralph Johnson, John Vlissides);
DIP - Princípio da Inversão de Dependências: baseado no trabalho de Grady Booch, Meilir Page-Jones e Barbara Liskov;
Em uma de suas falas antigas, Martin afirma que os princípios são importantes para projetistas Sênior e aspirantes a esse grau de conhecimento, com experiência de longa data na área de design de software. Afirma ainda que os novos programadores, com pouca experiência poderiam não compreender o real sentido dos princípios e deturpá-los, mesmo com boa intenção, ao tentar resumi-los para repassar a seus colegas.
Isso explica bastante coisa! Na maioria dos lugares onde se fala de SOLID (blogs, sites e literaturas), é tão resumido que não dá para entender. SOLID não é simplório mas é simples de praticar. A transmissão de informação anêmica é que dificultou a jornada do SOLID para nós brasileiros entendermos de fato.
Dica: Busque palestras do Robert Martin no youtube, tem várias antigas e novas.
O DIP (Dependecy Inversion Principle)
Um grande exemplo dessa confusão é o funcionamento do Princípio da Inversão de Dependência. Ele é muito simples e afirma que se uma classe for depender de outra, esta deve ser mais estável.
“o código que implementa a diretiva de alto nível não deve depender do
código que implementa detalhes de baixo nível” (Robert Martin, Design Principles and Design Patterns).
Em outras palavras, se a classe A depender da classe B, B deve ser mais estável que A, de forma que as dependências entre as classes sempre sigam em direção à estabilidade, dependendo de módulos mais estáveis que ela própria.
Se seu programa depender de um módulo onde os métodos mudam a cada versão, por exemplo, você terá sempre o trabalho de atualizar todas classes que o utilizam. Quanto mais estáveis as dependências forem, menos mudanças, mais agilidade, mais lucro e menos tempo perdido.
Simples e óbvio, como um software sólido deve ser.
Conclusão
Não é uma questão de defender ou criticar o SOLID. É uma questão de defender o conhecimento, e criticar a entrega de software ruim.
É muito fácil fazer software ruim, por isso é importante saber (entender de verdade) como pessoas mais experientes que nós lidaram com os mesmos problemas e os solucionaram.
Para uma ideia se tornar um princípio ou um padrão, é necessário que, primeiro, seja comprovado que muitos projetos fizeram uso dessa ideia e alcançaram os mesmos resultados. Isso só é possível com o tempo, com a experiência, com espírito de pesquisa e leitura de bons autores.
Abaixo, as referências para as obras usadas por Martin na formulação dos princípios:
- CONSTANTINE, Larry L. Structured design. IBM Systems Journal, VOL13, NO 2, 1974;
- DEMARCO, Tom. Structured Analysis and System Specification, Press Computing Series, Yourdon, 1979;
- DIJKSTRA, Edsger W. On the role of scientific thought. Burroughs Research Fellow, Netherlands, 1974;
- GAMMA et all. Design Patterns: Elements of Reusable Object-Oriented Software, Addison Wesley, 1995;
- BOOCH, Grady. Object Solutions, Addison Wesley, 1996;
- JACOBSON, Ivar. Object Oriented Software Engineering a Use Case Driven Approach, Addison Wesley, 1992;
- LISKOV e WING. A behavior notion of subtyping. Carnegie Mellom University: Pensilvânia, USA, 1994. Disponível em https://www.cs.cmu.edu/~wing/publications/LiskovWing94.pdf. Acesso em 03/08/2019;
- MEYER, Bertrand. Object-Oriented Software Construction. Prentice Hall, 1988;
- PAGE-JONES, Meilir. The Practical Guide to Structured Systems Design, 2d. ed., Yourdon Press Computing Series, 1988;
- PARNAS, David L. On the Criteria To Be Used in Decomposing Systems into Modules. Carnegie-Mellon University, 1971.