Para entender a motivação do any
, é preciso, antes, entender um dos princípios fundamentais do TypeScript, que é possibilitar a adoção gradual.
Por muito tempo, o ecossistema do JavaScript não teve nenhum meio eficiente de verificar, estaticamente, os scripts e “programas” que eram desenvolvidos com essa linguagem. Como a tipagem dinâmica do JavaScript, aliada aos diversos quirks da linguagem, eram (e ainda são) a fonte de muitos bugs, surgiu o TypeScript para garantir maior robustez ao desenvolvimento. Há quem diga, bem enfaticamente, que tipos estáticos ajudam bastante nesse caso – e, embora isso não venha ao caso, eu concordo.
Naturalmente, iriam surgir casos nos quais uma codebase, originalmente implementada em JavaScript, teria seus desenvolvedores optarem por migrá-la ao TypeScript. O poblema é que, a depender do tamanho da base de código, a tarefa é, não raro, difícil. Daí surge a necessidade de mecanismos para garantir uma adoção gradual do TypeScript mais flexível.
O any
é um desses mecanismos. Ele é um meio de dar flexibilidade ao programador. O uso do any
é como se o programador falasse, ao compilador, o seguinte:
Eu quero que você, compilador, não se preocupe com este valor. A ele atribuo este tipo coringa, any
, que basicamente me permite fazer qualquer coisa com ele sem que você me encha a paciência.
É isso.
Pense no any
como a união de todos os tipos do TypeScript. Um valor do tipo any
aceita qualquer coisa e, por isso, não é nada seguro. Ao usar any
, abre-se mão, por conveniência, de todas as seguranças que o TypeScript te dá.
E só para enfatizar um pouco mais a definição, voltemo-nos à documentação do TypeScript, que diz:
O TypeScript também tem um tipo especial, any
, que você pode usar sempre que não quiser que um valor específico cause erros de type-check.
Quando um valor é do tipo any
, você pode acessar qualquer uma de suas propriedades (que também serão do tipo any
), chamá-lo como função, atribuí-lo a valores de qualquer tipo – em resumo: qualquer coisa que não seja sintaticamente ilegal.
Reiterando, veja que o uso de any
abre mão das seguranças que o TypeScript oferece. Por isso, em versões mais recentes do TypeScript, surgiu o unknown
, que faz algo parecido, porém com um pouco mais de segurança.
Ainda sobre o any
, documentação diz mais:
Quando você não especifica, explicitamente, um tipo e o TypeScript não consegue inferi-lo pelo contexto, o compilador usará any
como padrão. Assumindo que a opção noImplicitAny
esteja desativada (que é o comportamento padrão, embora menos seguro).
Com isso, podemos aludir ao exemplo de código da pergunta:
let var1: any = "Hello World";
let var2 = "Hello World";
São coisas diferentes. No caso acima, var1
terá o tipo any
. Já var2
, devido à possibilidade de inferência do TypeScript, terá o tipo string
. Portanto, é o mesmo que:
let var1: any = "Hello World";
let var2: string = "Hello World";
Esse é um dos casos em que o TypeScript consegue, seguramente, inferir o tipo da variável. E isso é óbvio para o compilador, tanto é que nenhum aviso é emitido ou any
é assumido por padrão. Você está atribuindo à var2
uma string, que está no próprio código. Nesse tipo de caso, é claro ao TypeScript que aquela variável sempre será uma string (veja que a ela sempre será atribuída uma string literal). Portanto, diz-se que string
é o tipo inferido.
Veja a diferença entre este trecho, no qual não há inferência possível e any
é assumido; e este, com a opção noImplicitAny
habilitada e há erro emitido.
Esse é um dos poderes do TypeScript, que tem relativamente boa habilidade de inferência. Conforme já vimos anteriormente, quando a inferência não é possível, por padrão, any
será utilizado, mas existe uma opção que proíbe esse comportamento, exigindo do programador, nesse tipo de caso, explicitar o tipo. Trata-se de noImplicitAny
.
Portanto, tem que tomar cuidado para saber quando o tipo é any
e quando o tipo é inferido. Se você estiver utilizando um editor que suporte (como o VSCode), ao passar o mouse sobre um valor, poderá ver o tipo que ela assume. Aí fica fácil de saber.
Em resumo, o any
é um coringa – mas tem que tomar cuidado para não confundir esse “coringa” com a inferência.
A inferência, quando aliada à opção noImplicitAny
, é algo que garante segurança e robustez ao código. É uma conveniência do compilador para que você não tenha sempre, onde é óbvio pelo contexto, de explicitar o tipo manualmente.
O any
é um escape-hatch que te permite abrir mão de certa segurança por flexibilidade. É uma conveniência que vale a pena em ocasiões como a migração gradual. Quando TypeScript está sendo utilizado desde o dia zero, raramente faz sentido, já que se abre mão de segurança.
unknown
....unknown
: Como o tipo “unknown” funciona em TypeScript?.