Uma breve introdução
O primeiro trabalho hoje reconhecido como pertencente à área de Inteligência Artificial (IA) foi realizado por Warren McCulloch e Walter Pitts em 1943. Esse trabalho foi baseado em três fontes/assuntos-base:
- o conhecimento da fisiologia básica e da função dos neurônios no cérebro (um assunto com origem na Ciência Cognitiva)
- a análise formal da lógica proposicional (um assunto com origem na Filosofia e na Matemática)
- e a Teoria da Computação de Alan Turing (o assunto que deu origem à Ciência da Computação)
Mas o termo "Inteligência Artificial" somente foi cunhado em 1956 pelo cientista de computação John McCarthy, em uma conferência que teve também a participação de Marvin Minsky (co-fundador do MIT e um dos principais teoristas da IA). McCarthy tinha muito interesse em lógica, um ramo que é intuitivamente ligado à manipulação e ao raciocínio simbólico dos seres humanos, e por isso teve o interesse de estudar a forma como aspectos da inteligência (como criatividade, auto-aperfeiçoamento e uso da linguagem, por exemplo) poderiam ser reproduzidos em sistemas computacionais (consequentemente, de forma "artificial").
Para mais detalhes da história da IA, consulte o Capítulo 1 do livro
Artificial Intelligence: A Modern Approach, de Stuart Russell and
Peter Norvig. Esse é o livro mais utilizado em cursos de IA nas
principais Universidades do mundo (sendo também a minha sugestão para
quem deseja se aprofundar no assunto), e seus autores são ilustres -
especialmente Peter Norvig, que atualmente é Diretor de Pesquisas
na Google Inc.
Deve ser possível perceber que nos primórdios da IA havia uma grande preocupação com o entendimento e a reprodução da inteligência em seres humanos. Porém, uma primeira grande dificuldade é justamente definir o que é inteligência. Por um lado, pode-se dizer que inteligência é o conjunto de capacidades cognitivas de um ser humano, incluindo comunicação, percepção e pensamento abstrato. Mas, por outro lado, outros seres sem toda essa capacidade também são inteligentes.
Os chimpanzés são reconhecidamente muito inteligentes, pois apesar de não terem toda a nossa capacidade cognitiva ainda assim são capazes de fazer planos e comunicar intenções (e sob certos aspectos, poder-se-ia dizer que são até mais inteligentes do que os humanos modernos hehehehe). A proximidade genética não é a questão aqui, pois os corvos também são muito inteligentes, sendo capazes de fazer planos elaborados e aprender com tentativa e erro para se adaptar ao ambiente. Ou seja, inteligência não envolve apenas raciocínio abstrato e planejamento, mas também reatividade e adaptação. Uma mosca pode ser considerada inteligente no sentido de que é capaz de evitar com sucesso a maioria dos seus ataques com o chinelo.
Nesse sentido, os estudos da IA eventualmente evoluiram para outros conceitos. O artigo Elephants Don't Play Chess (Elefantes não Jogam Xadrez), de Rodney Brooks, que deu origem à Arquitetura de Subsunção amplamente utilizada em robôs da academia e da indústria, pregam que inteligência é algo mais simples, e cuja complexidade advém das diversas formas de comportamento onde ela é expressa. Assim, na IA - como ciência aplicada - o conceito ideal de inteligência é a racionalidade: fazer o melhor sempre que possível.
Apesar de originalmente a IA ter um foco muito forte na reprodução das capacidades humanas, hoje acredita-se que ela tem um objetivo mais aplicado (a discussão sobre a IA fraca e forte da resposta do colega @mgibsonbr trata justamente dessa dualidade de intenções). Russell e Norvig, em seu livro, fazem uma comparação interessante:
O objetivo da Engenharia Aeronáutica não é criar máquinas voadoras que
sejam perfeitas a ponto de enganar aos pássaros, mas sim de criar
máquinas voadoras que façam isso (voem) da melhor maneira possível.
Também o objetivo da IA, como uma disciplina de engenharia, não
deveria ser criar máquinas que agem tão perfeitamente a ponto de
enganar aos humanos. Mas sim de criar máquinas que são capazes de se
adaptar para resolver problemas complexos.
Isso não quer dizer que estudar IA não sirva para nos ajudar a também entender as nossas capacidades biológicas. Afinal de contas, a IA envolve diversas áreas, entre elas o Processamento de Linguagem Natural, a Representação de Conhecimento, o Raciocínio Automatizado, o Aprendizado (de Máquina), a Visão (de Computador) e a Movimentação e Manipulação de Objetos (isto é, ter um corpo físico e se reconhecer como um agente no mundo, algo importante para a Robótica).
Respondendo às suas perguntas
1. Qual a definição de inteligência artificial?
A Inteligência Articial é uma área de desenvolvimento que tangencia a Ciência da Computação na construção de sistemas computacionais capazes de resolver problemas complexos e a Engenharia na construção dos sensores e atuadores necessários para que os agentes dito inteligentes sejam de fato racionais (no sentido de que buscam fazer o melhor sempre que possível). Por isso, a arquitetura geral de um sistema inteligente (dito um agente, já que ele existe em um ambiente, percebe as alterações nesse ambiente - suas e de outros agentes - e atua/age para mudá-lo na tentativa de atingir seus objetivos) é a seguinte:
A Engenharia entra na construção dos sensores e atuadores do agente (e também do ambiente, em muitos cenários), e a Ciência da Computação entra na construção do mecanismo de decisão (a caixinha com a interrogação ali dentro).
2. Partindo de uma definição como esta "sistemas que pensam como um humano", seria correto dizer que todo sistema que afirme que 2+2 = 4 é um sistema com "inteligência artificial"?
Não, porque realizar o cálculo 2 + 2 = 4
não requer "pensamento", principalmente o raciocínio como nós humanos fazemos. A sua calculadora é capaz de fazer esse cálculo apenas com operações lógicas simples. Foque nesse símbolo: "2". Isso pode significar qualquer coisa, ou pode não significar nada. Qual é a diferença entre "2", "II", ".." ou duas pedras no meio de uma cratera em Marte? O pensamento só ocorre no momento em que alguém (ou algo) dá significado a um símbolo ou uma operação.
Nesse aspecto, um sistema computacional que gere "4" como resposta a duas entradas de "2" e "2" é meramente um programa. Foi programado para tal e provavelmente vai dar algum erro se ao menos uma das entradas for diferente (".." + 2
dá quanto? Provavelmente erro de type mismatch! :) ). Um sistema inteligente busca fazer o melhor que conseguir. Ele não vai meramente dar erro ou "quebrar" (crash), pois vai gerar um resultado que pode ser momentaneamente ruim até que ele tenha a possibilidade de se adaptar para essa nova entrada (talvez solicitando a resposta correta para outro agente que a saiba, por exemplo).