Métodos estáticos são tão flexíveis quanto granito. Se você precisa fazer o mock de um método estático, é sinal de que há algo errado no projeto.
Um método estático idealmente oferece uma funcionalidade definitiva e imutável. Se você precisa mocká-lo para isolar o seu teste de suas dependências, então é porque ou ele não é definitivo e nem imutável, e portanto não deveria ser estático, ou então não era algo para você mockar.
A ideia de usar mock é isolar o código sob teste de suas dependências. Entretanto, é importante frisar-se que há diferentes tipos de dependências e nem todas valem a pena serem mockadas.
Por exemplo, imaginemos esse código:
package com.example.meucodigo;
public class MinhaClasse {
public static double sincos(int a) {
double r = Math.sin(a);
double s = Math.cos(a);
return r + s;
}
}
Naturalmente, como pode se ver, ele retorna a soma do seno e do co-seno de um número. A forma adequada de testá-lo (com JUnit 5) seria assim:
package com.example.teste;
import com.example.meucodigo.MinhaClasse;
import org.junit.jupiter.api.Assertions;
import org.junit.jupiter.api.Test;
public class TesteSinCos {
@Test
public void teste0() {
Assertions.assertEquals(1.0, MinhaClasse.sincos(0));
}
@Test
public void teste30() {
Assertions.assertEquals(Math.srqt(3) / 2 + 0.5, MinhaClasse.sincos(Math.PI / 6));
}
@Test
public void teste45() {
Assertions.assertEquals(Math.sqrt(2), MinhaClasse.sincos(Math.PI / 4));
}
@Test
public void teste90() {
Assertions.assertEquals(1.0, MinhaClasse.sincos(Math.PI / 2));
}
}
Observe que no teste acima não foi usado mock e ele nem mesmo se preocupa em saber que a implementação usa Math.sin
e Math.cos
. Usar o mock nesse caso seria um abuso, pois o uso de Math.sin
e Math.cos
é uma parte imutável e interna do método exercitado. Se mockassemos essas funções, estaríamos basicamente testando um método de adição simples, e não testando a funcionalidade realmente oferecida pelo método. Além disso, sob o ponto de quem utiliza o método, externo a ele, a dependência de determinado método estático é um detalhe encapsulado da implementação. Projetar a API de forma que isso possa ser mockado (ou seja, injetando-se os métodos de seno e co-seno na classe MinhaClasse
) é ruim e resulta em um aumento da complexidade sem real benefício, tornando a classe em questão mais difícil de ser usada, mais difícil de ser instanciada e mais difícil de ser testada. Você deve projetar classes e métodos que possam ser testadas sem violar o encapsulamento natural deles.
No entanto, obviamente, há diversos casos onde o uso de mocks justifica-se, em especial quando a dependência é algo polimórfico, excessivamente complexo, que depende de estado externo e/ou que têm métodos que quando utilizados, produzem efeitos colaterais em objetos que não sejam os seus parâmetros. Por exemplo:
import java.sql.Connection;
public class Conexao {
public static Connection conectar() {
// ...
}
}
import java.sql.Connection;
import java.sql.PreparedStatement;
import java.sql.ResultSet;
public class ClienteDAO {
private static final String INADIMPLENTES_SQL = "SELECT * FROM BLABLA";
public List<Cliente> listarInadimplentes() {
List<Cliente> inadimplentes = new ArrayList<>();
try (
Connection c = Conexao.conectar();
PreparedStatement ps = c.prepareStatement(INADIMPLENTES_SQL);
ResultSet rs = ps.executeQuery();
)
{
// ...
}
return inadimplentes;
}
}
Nesse caso, o ClienteDAO
depende do método estático Conexao.conectar()
. Ele também depende de uma String
que está chapada em seu código.
Esse é um caso típico de onde o uso do mock é desejável e o uso do método estático causa problemas. A melhor solução seria eliminar o uso do método estático e usar injeção de dependência no lugar:
import java.sql.Connection;
import java.sql.PreparedStatement;
import java.sql.ResultSet;
import java.util.function.Supplier;
public class ClienteDAO {
private static final String INADIMPLENTES_SQL = "SELECT * FROM BLABLA";
private final Supplier<Connection> conector;
public ClienteDao(Supplier<Connection> conector) {
this.conector = conector;
}
public List<Cliente> listarInadimplentes() {
List<Cliente> inadimplentes = new ArrayList<>();
try (
Connection c = conector.get();
PreparedStatement ps = c.prepareStatement(INADIMPLENTES_SQL);
ResultSet rs = ps.executeQuery();
)
{
while (rs.next()) {
// ...
}
}
return inadimplentes;
}
}
E então, você pode mockar o Supplier<Connection>
com uma implementação que fornece um Connection
mockado que produz PreparedStatement
s mockados que produzem ResultSet
s mockados. Isso ainda dá bastante trabalho, mas não deve ser muito difícil de fazer com o mockito e te livra da necessidade de ter um banco de dados real e te dá controle sobre as dependências.
Em geral, a abordagem a ser usada com métodos que fabricam objetos polimórficos é essa. Ao invés de depender de um método estático de fábrica ou de um singleton, você troca isso por injeção de dependências. Ou seja, a solução não é mockar o método estático ou o singleton, e sim eliminar o seu uso!
Ainda há a SQL estática no código acima. A rigor essa SQL deveria ser um detalhe da implementação encapsulado no ClienteDAO
. O problema é que ela "vaza" e torna-se visível para as suas dependências. A solução seria colocá-la em uma classe a parte e injetá-la (tem a vantagem de tornar as SQLs mais flexíveis, mas aumenta-se a complexidade) ou então colocar o modificador public
nela (mais simples, mas menos flexível e pode atentar contra o encapsulamento).
É verdade que há muitas coisas que uma classe pode fazer que dependem de métodos estáticos, construtores e singletons que se fossem todos refatorados para serem injetados como dependências, acabaria produzindo algo com tantos pontos de injeção de dependências e com tanto polimorfismo em excesso que praticamente não seria mais usável. Parte da solução para isso é:
Preferir usar classes de dados imutáveis, algo que simplifica bastante os testes, elimina bastante a necessidade de você querer ou precisar mockar muitas coisas e elimina bastante o excesso de polimorfismo. Nesses casos, quando o construtor (que podem ser múltiplos e com diversos parâmetros, se necessário) finalizarem a sua execução, o objeto tem que estar pronto para ser usado e não necessitar de nenhuma alteração a mais. Se precisar de alterar um objeto, pense em criar novos objetos derivativos semelhantes ao invés de alterar. Veja mais sobre isso nessa outra resposta minha.
Eliminar métodos e objetos estáticos mutáveis ou que produzem efeitos colaterais ao colocá-los como parte de um "mundo", de um contexto. Por exemplo, se o seu processamento de folha de pagamento define uma variável estática mutável contendo o arquivo a ser processado e coloca em outras variáveis estáticas mutáveis as linhas processadas, a solução seria criar uma classe FolhaDePagamento
e nela colocar uma variável de instância contendo o arquivo a ser processado e em outras variáveis de instância as linhas processadas. Ou seja, muitas vezes, as variáveis estáticas e os métodos que acompanham podem ser agrupados em um mundinho representado por uma instância de um objeto não-singleton. Isso tende a eliminar muitos casos de ocorrência de métodos estáticos, além de melhorar a organização do código.
Preferir especificar objetos com comportamentos altamente polimórficos por meio de interfaces. Isso é algo um tanto básico de programação orientada a objetos, mas muitas vezes esquecido e/ou negligenciado.
Utilizar lambdas e method references para casos onde o polimorfismo desejado seja algo simples.
Substituir a fabricação de objetos por meio de métodos estáticos e construtores por factories. Um exemplo disso é o do ClienteDAO
refatorado acima.
Em geral, ter métodos estáticos que produzem efeitos colaterais, dependem de estados externos ou que envolvam polimorfismo é um sinal de que coisas erradas estão acontecendo no seu projeto e que refatorações são necessárias para eliminá-los. Já os métodos estáticos que não produzem efeitos colaterais, não envolvem polimorfismo e nem dependem de estado externo não deveriam ter razão para serem mockados.
Quanto aos singletons e enums, estes, bem como quaisquer outros objetos estáticos, também deveriam ser imutáveis e não depender de qualquer estado externo.
Há casos como um método que utilize Collections.sort(List)
que podem parecer complicados. Esse método produz efeitos colaterais apenas em seu parâmetro, mas não depende de estado externo e nem é algo polimórfico. Ele é um caso análogo ao Math.sin
, e portanto não deve ser mockado.
Indo na pergunta que você usou como exemplo, vamos ver o que há no código e na solução encontrada:
public class ClasseA {
public static final int constA = ClasseB.metodoB();
public int metodoA(){
System.out.println("Passei no metodo A");
return 2;
}
}
@RunWith(PowerMockRunner.class)
@PrepareForTest( { ClasseA.class,ClasseB.class })
public class TestesClasses {
@Mock
private ClasseA classeA;
@BeforeClass
public static void setUp(){
PowerMockito.mockStatic(ClasseB.class);
Mockito.mock(ClasseA.class);
}
@Test
public void testando(){
PowerMockito.when(ClasseB.metodoB()).thenReturn(5);
Mockito.when(classeA.metodoA()).thenReturn(1);
int retornoA = classeA.metodoA();
int retornoB = ClasseB.metodoB();
System.out.println("Retorno A: "+retornoA);
System.out.println("Retorno B: "+retornoB);
}
}
Esse exemplo é bastante artificial, então não dá para dizer com certeza o que de fato deveria ter sido, mas vou tentar usá-lo mesmo assim. O problema aqui é que o metodoB()
fornece uma constante que não é exatamente uma constante, uma vez que, dada a necessidade de mocká-lo, conclui-se que o seu comportamento talvez seja polimórfico. O certo seria haver uma instância de ClasseB
ou de alguma outra classe onde o metodoB()
fosse chamado como um método de instância. Quanto ao constA
, dado que isso dependeria então de uma instância de ClasseB
, logo ele corresponde a parte de um contexto no qual as instâncias de ClasseA
são usadas e criadas, e portanto ClasseB
ou seria uma dependência de ClasseA
ou então seria responsável por fabricar objetos de ClasseA
.
Agora, respondendo diretamente às suas perguntas:
Se podemos fazer, quando devemos fazer?
Idealmente nunca. Faça isso só quando não houver outra saída, como no caso de o código a ser testado não poder ser modificado ou não for viável de ser modificado.
Quais são os casos em que mock de método estático é benéfico?
Nunca. Isso é uma má prática de programação e só deve ser usada em último caso quando o código a ser testado não puder ou não for viável de ser modificado.
Quando consigo detectar que o uso desse mock está sendo abusivo?
Ele sempre é abusivo.
goto
ou "abusar do não abuso dogoto
"; uso indiscriminado/não recomendado/lesivo para o projeto. "Detectar uso abusivo" então seria uma espécie de procedimento para reconhecer esses usos através da leitura do código/teste/informações satélites e relacionadas