Abrir e fechar recursos no Java, até o Java 6, era uma tarefa muito tediosa de se fazer e muito propensa a erros. Fechar os recursos abertos (invocando o método `close()`) frequentemente é algo que ou acaba sendo esquecido de ser feito ou que o programador o faz de forma inadequada, pois há vários complicadores para se fazer isso. Por exemplo, veja este código: <!-- language: lang-java --> public class ConexaoFalhouException extends Exception { public ConexaoFalhouException(Throwable cause) { super(cause); } } public class AlunoDAO { private static final String SQL_ALUNOS_POR_TURMA = "SELECT id, nome, telefone FROM alunos WHERE id_turma = ?"; public static void localizarAlunos(String turma) throws ConexaoFalhouException { Connection c = null; PreparedStatement ps = null; ResultSet rs = null; try { Connection c = Conexao.obter(); PreparedStatement ps = c.prepareStatement(SQL_ALUNOS_POR_TURMA); ps.setString(1, turma); rs = ps.executeQuery(); List<Aluno> alunos = new ArrayList<Aluno>(); while (rs.next()) { Aluno a = new Aluno(); a.setInt(rs.getInt(1)); a.setNome(rs.getString(2)); a.setTelefone(rs.getString(3)); alunos.add(a); } return alunos; } catch (SQLException e) { throw new ConexaoFalhouException(e); } finally { try { if (rs != null) rs.close(); if (ps != null) ps.close(); if (c != null) c.close(); } catch (SQLException e) { throw new ConexaoFalhouException(e); } } } } Este é o código que um programador experiente em Java 6 tipicamente escreveria. Apesar de tudo, ainda há umas coisas chatas nele: * O programador sempre tem que ter o cuidado de se lembrar de chamar o `close()` manualmente. * Se o programador não usar o bloco `try-finally`, colocando o `close()` no `finally`, o recurso ficará aberto se uma exceção for lançada. * Se o programador se esquecer de usar os `if`s no bloco `finally`, ele pode ter um `NullPointerException` como resultado. * Se um dos métodos `close()` do bloco `finally` lançar uma exceção, os demais recursos não serão fechados adequadamente, a menos que cada um deles esteja isolado dentro do seu próprio `finally`. * Se um dos métodos `close()` do bloco `finally` lançar uma exceção, essa exceção vai ser lançada e vai esconder qualquer exceção lançada no bloco `try`. * Os métodos `close()` forçam você colocar um outro bloco `try-catch` dentro do bloco `finally`, mesmo já tendo um bloco `catch (SQLException e)` antes do `finally`, tendo que então duplicar o bloco `catch`. Isso é contornável ao se usar um bloco `try-finally` dentro do `try-catch`, mas mesmo assim, qualquer solução desse tipo é mais complicada do que o que deveria ser. Esses problemas aí mostram que mesmo seguindo as melhores práticas, o código resultante ainda é bastante feio, confuso, propenso a erros, polui a lógica de negócio e é fácil de quebrar. E grande quantidade desse código é dedicado a lidar com a forma adequada de fechar o recurso prevendo todos os casos especiais possíveis que muitas vezes acaba ficando maior do que a parte que usa o recursos para fazer algum trabalho útil. Pensando-se nesse problema, é que a sintaxe do *try-with-resources* foi concebida. A finalidade dessa sintaxe é exatamente a de livrar o programador da necessidade e da complexidade de fechar explicitamente os recursos abertos, além de lidar com todos esses casos especiais automaticamente sem que o programador precise se preocupar com eles. Eis como fica o mesmo código usando o *try-with-resources*: <!-- language: lang-java --> public class ConexaoFalhouException extends Exception { public ConexaoFalhouException(Throwable cause) { super(cause); } } public class AlunoDAO { private static final String SQL_ALUNOS_POR_TURMA = "SELECT id, nome, telefone FROM alunos WHERE id_turma = ?"; public static void localizarAlunos(String turma) throws ConexaoFalhouException { try ( Connection c = Conexao.obter(); PreparedStatement ps = c.prepareStatement(SQL_ALUNOS_POR_TURMA); ) { ps.setString(1, turma); try (ResultSet rs = ps.executeQuery()) { List<Aluno> alunos = new ArrayList<>(); while (rs.next()) { Aluno a = new Aluno(); a.setInt(rs.getInt(1)); a.setNome(rs.getString(2)); a.setTelefone(rs.getString(3)); alunos.add(a); } return alunos; } } catch (SQLException e) { throw new ConexaoFalhouException(e); } } } Observe que usando o *try-with-resources*, não é mais necessário colocar-se um bloco `finally` para se fechar os recursos e nem mesmo chamar o método `close()` e você não precisa mais codificar toda essa parafernália. Um bloco `finally` adequado é acrescentado *automagicamente* pelo compilador, e ele já sabe lidar com todos os casos bizarros citados acima. Note também que apenas um `catch (SQLException e)` é necessário. A sintaxe do *try-with-resources* é assim: 1. A palavra-chave `try` 2. Um abre parênteses `(`. 3. Uma ou mais declarações de recursos separadas/terminadas por ponto-e-vírgula. 4. Um fecha parênteses `)`. 5. Um abre chaves `{`. 6. Várias instruções que são executadas dentro do bloco `try`. 7. Um fecha chaves `}`. 8. Opcionalmente um ou mais blocos `catch`. 9. Opcionalmente um bloco `finally`. Os itens 8 e 9 acima significam que o fato de você estar usando um bloco *try-with-resources* não significa que você perde a capacidade de usar os blocos `catch` ou `finally`. Você pode continuar usando-os se quiser. Quanto ao item 3, você deve estar imaginando como o compilador sabe o que é ou não um recurso. Por exemplo, isso daqui dá erro de compilação porque `String` não é um recurso válido: <!-- language: lang-java --> try (String x = "aaa") { // blablabla } A resposta está na interface [`java.lang.AutoCloseable`](https://docs.oracle.com/javase/8/docs/api/java/lang/AutoCloseable.html). Esta interface foi acrescentada no Java 7 para denotar quais são as classes que representam recursos que podem ser usados dentro dos parênteses do *try-with-resources*. A interface `java.io.Closeable` que já existia antes passou a herdar de `java.lang.AutoCloseable`. A interface `AutoCloseable` tem apenas um método: <!-- language: lang-java --> void close() throws Exception; E é esse o método que vai ser invocado no bloco `finally`. Implementações podem refinar ele ao substituir a exceção lançada por outras mais específicas (por exemplo, `SQLException` ou `IOException`). Isso também significa que se você quiser criar a sua classe personalizada e específica de recurso e usar ela no *try-with-resources*, basta implementar a interface `AutoCloseable`. Como o bloco `finally` acrescentado automaticamente pode lançar essas exceções de dentro do método `close()`, elas também tem que ser capturadas ou relançadas tais como seriam com quaisquer outras *checked-exceptions*. Por exemplo, veja o seguinte código: <!-- language: lang-java --> class MeuException extends Exception {} class Teste implements AutoCloseable { @Override public void close() throws MeuException {} } class Principal { public void metodo() { try (Teste t = new Teste()) { // ... } } } Ele gera o seguinte erro de compilação: > Unhandled exception type MeuException thrown by automatic close() invocation on t. Que traduzindo, seria isso: > Exceção não-tratada do tipo MeuException lançada pela invocação automática do close() no t. Assim sendo, essa exceção também tem que ser ou capturada ou relançada: <!-- language: lang-java --> class Principal { public void metodoQueRelancaExcecoes() throws MeuException { try (Teste t = new Teste()) { // ... } } public void metodoQueTrataExcecoes() { try (Teste t = new Teste()) { // ... } catch (MeuException e) { // Trata a exceção. } } } Outras regras específicas do *try-with-resources* que o compilador considera são que: * As variáveis declaradas dentro dos parênteses do `try` não podem ser redefinidas dentro dele. Ou seja, isso é um erro de compilação: try (Connection conn = teste1()) { conn = teste2(); } Para todos os efeitos, a variável usada como recurso é "*effectivelly-final*". Ou seja, o compilador considera ela como se o modificador `final` estivesse presente. Essa restrição é importante e extremamente bem-vida, porque sem ela, seria possível usar o *try-with-resources* para abrir um recurso e fechar um outro, o que acabaria por minar o propósito para o qual o *try-with-resources* foi concebido e abrir um caminho para o surgimento de muitos bugs difíceis de rastrear no fechamento adequado de recursos. * No Java 7 e no Java 8, as variáveis declaradas dentro dos parênteses do `try` **não** podem ser reutilizadas, elas tem que ser declaradas neste ponto. Isso significa que os dois códigos abaixo dão erros de compilação: Connection conn1 = teste1(); try (conn1 = teste2()) { // blablabla } Connection conn2 = teste1(); try (conn2) { // blablabla } A partir do Java 9, essa restrição foi relaxada, desde que a variável reutilizada ainda seja *effectivelly-final*. Logo, no Java 9, o primeiro `try` acima continua sem compilar, enquanto que o segundo compila. Por fim, ainda há mais um detalhe. O que ocorre quando o bloco `try` lança uma exceção e o `close()` também? O que é feito para evitar-se que a exceção original seja perdida? A resposta está no conceito de exceções suprimidas (*suppressed exceptions*), que foi criado no Java 7 para lidar com este tipo de problema. Uma exceção pode ter uma causa (desde o Java 1.4) e várias outras exceções que ela suprime (desde o Java 7). Na classe `Throwable`, os métodos [`addSuppressed(Throwable)`](https://docs.oracle.com/javase/8/docs/api/java/lang/Throwable.html#addSuppressed-java.lang.Throwable-) e [`getSuppressed()`](https://docs.oracle.com/javase/8/docs/api/java/lang/Throwable.html#getSuppressed--) foram adicionados. No bloco `finally` gerado automagicamente, se o bloco `try` tiver lançado uma exceção e o método `close()` lançar outra exceção, então a exceção que vai ser lançada para fora do `finally` será a exceção do bloco `try` tendo a exceção gerada no `close()` como suprimida. Assim, o *stacktrace* conterá informações também da exceção suprimida. Eis um exemplo: <!-- language: lang-java --> class MeuException1 extends Exception {} class MeuException2 extends Exception {} class Teste implements AutoCloseable { @Override public void close() throws MeuException1 { throw new MeuException1(); } } public class Principal { public static void main(String[] args) throws MeuException1, MeuException2 { try (Teste t = new Teste()) { throw new MeuException2(); } } } Eis a saída: <!-- language: lang-none --> MeuException2 at Main.foo(Main.java:21) at Main.main(Main.java:13) Suppressed: MeuException1 at Teste.close(Main.java:6) at Main.foo(Main.java:22) ... 1 more