O pattern matching não é o mesmo que um switch
. No código de exemplo que está na pergunta, ele pode até se parecer, mas se entrarmos nos detalhes, veremos que é bem diferente.
Segundo a PEP 635, o que o pattern matching faz é: "builds a generalized concept of iterable unpacking. Binding values extracted from a data structure is at the very core of the concept and hence the most common use case".
Ainda, este artigo (que possui entre os seus autores o próprio criador do Python) cita que "Pattern matching allows programs both to extract specific
information from complex data types, as well as to branch
on the structure of data and thus apply specialized actions
to different forms of data".
Ou seja, a ideia do pattern matching é a extração de valores baseados em algum padrão. O fato de poder ser usado de forma similar a um switch
(ou a uma cadeia de if
/else
) é circunstancial. Mas vamos aos detalhes...
A especificação do pattern matching está na PEP 634, a motivação para criá-lo está na PEP 635 e um tutorial completo pode ser visto na PEP 636, então só vou apontar algumas linhas mais gerais, para dar uma noção do que é.
A primeira diferença para o switch
é que no match
não há o fall through: uma vez que ele entra em uma opção, as demais são ignoradas.
Ou seja, o código abaixo só imprime "Not found":
status = 404
match status:
case 400:
print("Bad request")
case 404:
print("Not found")
case 418:
print("I'm a teapot")
case _:
print("Something's wrong with the Internet")
Mas em linguagens que possuem switch
(como JavaScript), caso não haja um break
dentro de cada case
, ocorre o fall through:
var st = 404;
switch (st) {
case 400:
console.log('Bad request');
case 404:
console.log('Not found');
case 418:
console.log("I'm a teapot");
default:
console.log("Something's wrong with the Internet");
}
O código acima imprime:
Not found
I'm a teapot
Something's wrong with the Internet
Para que ele imprima apenas "Not found", é necessário ter um break
dentro de cada case
.
Então a primeira diferença é que o match
não precisa desse break
. Mas tem muito mais...
No link já citado tem todos os exemplos completos, mas para dar uma resumida, juntei vários em um só. Nos exemplos é usado um caso em que o usuário digita um comando e o match
analisa o que foi digitado para tomar uma ação:
command = input('command: ')
match command.split():
case ["quit"]:
print("Goodbye!")
quit_game()
case ["look"]:
current_room.describe()
case ["get", obj] | ["pick", "up", obj] | ["pick", obj, "up"]:
character.get(obj, current_room)
case ["go", direction] if direction in current_room.exits:
current_room = current_room.neighbor(direction)
case ["go", _]:
print("Sorry, you can't go that way")
case ["drop", *objects]:
for obj in objects:
do_something(obj)
case _:
print('invalid command')
Nos 2 primeiros casos (case ["quit"]
e case ["look"]
), há o pattern matching para valores específicos. Ou seja, se a string digitada for exatamente "quit" ou "look", ele cai no respectivo case
(lembrando que split
retorna uma lista, por isso o case
foi feito com uma lista contendo a string).
Depois vemos outro caso: case ["get", obj] | ["pick", "up", obj] | ["pick", obj, "up"]
. Aqui temos o |
, que indica "ou" - quer dizer que há 3 opções diferentes que podem cair neste case
. Ou é uma lista contendo a string "get" e alguma outra string (cujo valor será colocado na variável obj
), ou é uma lista com 3 strings, contendo "pick", "up" e alguma outra string (que será obj
), sendo que nas opções a ordem varia (ou seja, eu poderia digitar "pick up objeto" ou "pick objeto up").
A seguir temos a opção de adicionar um guard ao case
:
case ["go", direction] if direction in current_room.exits:
current_room = current_room.neighbor(direction)
case ["go", _]:
print("Sorry, you can't go that way")
Ou seja, se foi encontrado um match no case ["go", direction]
, a condição é avaliada (no caso, verifico se o valor de direction
é um dos que eu considero válidos). Se for, ele entra no case
, caso contrário, ele entra no case
de baixo.
Por fim, temos o caso em que é usado o unpacking: case ["drop", *objects]
. Ou seja, se for digitado "drop obj1 obj2 obj3", os valores "obj1", "obj2" e "obj3" estarão na lista objects
(se digitar apenas "drop", a lista objects
estará vazia).
Existe ainda a possibilidade de se fazer o matching na estrutura de um dicionário:
dados = {"text": "Lorem ipsum", "color": "azul"}
match dados:
case { "text": texto, "color": cor }: # cai neste case
print(f'imprimir "{texto}" na cor {cor}')
case { "sound": arquivo, "format": formato }:
print(f'Tocando {arquivo} (formato: {formato})')
Assim, eu posso verificar se o dicionário possui determinadas chaves e já atribuir os valores em variáveis. No exemplo acima, como o dicionário tem as chaves "text" e "color", as variáveis texto
e cor
terão os respectivos valores.
Vale lembrar que o dicionário pode ter outras chaves além das indicadas, e que o matching é feito na ordem em que os case
's estão, entrando no primeiro que for encontrado. Por exemplo, no caso abaixo, ele entra no primeiro case
(mesmo que ele tenha as chaves que também dariam match no segundo case
):
dados = { "sound": "musica", "format": "mp3", "text": "Lorem ipsum", "color": "azul"}
match dados:
case { "text": texto, "color": cor }: # entra neste case
print(f'imprimir "{texto}" na cor {cor}')
case { "sound": arquivo, "format": formato }:
print(f'Tocando {arquivo} (formato: {formato})')
Mas se eu invertesse a ordem dos case
's, ele encontraria primeiro as chaves "sound" e "format":
dados = { "sound": "musica", "format": "mp3", "text": "Lorem ipsum", "color": "azul"}
match dados:
case { "sound": arquivo, "format": formato }: # entra neste case
print(f'Tocando {arquivo} (formato: {formato})')
case { "text": texto, "color": cor }:
print(f'imprimir "{texto}" na cor {cor}')
E ainda existe a possibilidade de verificar os tipos dos valores:
dados = { "nome": "Fulano de tal", "idade": 30 }
match dados:
case { "nome": str(nome), "idade": int(idade) }:
print(f'{nome} tem {idade} anos')
case _:
print('matching not found')
Ou seja, somente se nome
for uma string e idade
for um inteiro, dará match no primeiro case
(por exemplo, se eu mudasse o valor da idade para a string "30"
, não funcionaria, e ele entraria no segundo case
).
E se quiser obter as chaves restantes (caso o dicionário tenha chaves a mais), basta usar um wildcard:
dados = { "nome": "Fulano de tal", "idade": 30, "email": "[email protected]", "filhos": 2 }
match dados:
case { "nome": str(nome), "idade": int(idade), **resto }:
print(f'{nome} tem {idade} anos', resto)
No exemplo acima, resto
será um dicionário contendo as chaves restantes ("email" e "filhos") e seus respectivos valores.
Enfim, como pode ver, é bem mais que um simples switch
, pois além de analisar o valor, o match
também pode avaliar a estrutura interna, inclusive com classes, conforme os exemplos abaixo:
# obviamente, assumindo que as classes Click, KeyPress e Quit existem
match event.get():
case Click(position=(x, y)):
handle_click_at(x, y)
case KeyPress(key_name="Q") | Quit():
game.quit()
case KeyPress(key_name="up arrow"):
game.go_north()
Ou seja, seria possível não só verificar se o evento é uma instância de determinada classe, como ainda obter os valores de seus atributos diretamente.
Um outro detalhe é que, diferente de outras linguagens (como por exemplo Rust, citado nos comentários), o match
não é exaustivo. Ou seja, não precisamos testar todas as possibilidades nos case
's.
Portanto, o exemplo da pergunta poderia não ter a cláusula default:
status = 444
match status:
case 400:
print("Bad request")
case 404:
print("Not found")
case 418:
print("I'm a teapot")
Neste caso, o código acima não imprime nada, pois nenhum dos case
's encontra um match.
E apenas para terminar, outra diferença para o switch
é que em muitas linguagens a cláusula default não precisa necessariamente ser a última. Por exemplo, em JavaScript, o código abaixo imprime "Something's wrong with the Internet":
var st = 444;
switch(st) {
case 400:
console.log("Bad request");
break;
default:
console.log("Something's wrong with the Internet");
break;
case 404:
console.log("Not found");
break;
case 418:
console.log("I'm a teapot");
break;
}
Mas no match
do Python, isso dá erro:
status = 444
match status:
case 400:
print("Bad request")
case _: # erro, cláusula "default" deve ser a última
print("Something's wrong with the Internet")
case 404:
print("Not found")
case 418:
print("I'm a teapot")
No caso, o case _
deve ser o último.
Enfim, em linhas gerais, é isso. Para todos os detalhes, leia as PEP's já listadas no início.