Isto é ponteiro para função, então na forma apresentada, assim como um parâmetro pode receber uma referência para um objeto, o parâmetro pode receber uma referência para uma função.
Portanto C possui o que se chama função de alta ordem ou de primeira classe. Tratamos funções como se fossem dados.
Uma função já é naturalmente uma referência, afinal o acesso a ela se dá pelo endereço do início do código escrito nesta função, de forma análoga a um vetor que tem um ponteiro para o primeiro elemento dele. Isso vale para funções estáticas mesmo, mas neste caso o endereço está associado a um identificador existente no código e chama-se ele diretamente, não tem muito o que fazer com isto.
Mas é possível armazenar esse endereço em uma variável, ou mesmo passar como argumento para uma função que espera justamente um tipo que seja uma função. É a função mesmo, não é chamar uma função no argumento e passar o resultado dela, você passa ela. Claro que fala-se passar a função sem que esteja copiando seu código de um lugar para outro, copia-se só o endereço.
Então assim como um vetor de inteiros você pode ter um parâmetro mais ou menos como int * x
quando é uma função que recebe um inteiro e retorna outra inteiro seria algo assim int (*x)(int)
, sendo que o primeiro int
indica que a função a ser recebida deve retornar um int
, ela será armazenada em uma variável chamada x
e receberá como argumento um int
, conforme demonstrado pelo último int
.
Eu descobri agora que podia usar a sintaxe sem o ponteiro, quando aprendi só podia usar assim e ainda preciso pesquisar se isso é padrão, mas acredito que sim pela fonte.
typedef
Obviamente que uma assinatura de função é um tipo da variável do parâmetro, sendo um tipo é possível criar um typedef
para ele e tornar a sintaxe mais agradável.
Não precisa ser só em parâmetro, mas é onde se encaixa melhor. Poderia ser um membro de uma struct
, tem casos interessantes para isto, e é uma forma de simular polimorfismo dinâmico.
Exemplos:
#include <stdio.h>
int func( int (*x)(int,int) ) { return x(20, 5); }
int func2( int x(int,int) ) { return x(20, 5); }
int func3( int(fn)() ) { return fn(); }
int func4( int(*fn)() ) { return fn(); }
typedef int cellulae_func(int, int);
int tabula(cellulae_func *cell, int lat, int alt) { return cell(lat, alt); }
int soma(int x, int y) { return x + y; }
int sub(int x, int y) { return x - y; }
int teste() { return 42; }
int main(void) {
printf("%d\n", tabula(soma, 20, 5));
printf("%d\n", tabula(sub, 20, 5));
printf("%d\n", func(soma));
printf("%d\n", func2(soma));
printf("%d\n", func3(teste));
printf("%d\n", func4(teste));
printf("%d\n", func4(soma)); //funciona, mas está errado
int (*funcs[2])(int x, int y);
funcs[0] = soma;
funcs[1] = sub;
printf("%d\n", func(funcs[0]));
}
Veja funcionando no ideone. E no repl.it. Também coloquei no GitHub para referência futura.
Note que passo os nomes estáticos das funções, e como esses nomes na verdade são ponteiros, estou passando o endereço delas. Do outro lado a variável que recebe esse ponteiro é usada para chamar a função usando a sintaxe dos parênteses. Ela não pode ser usada corretamente de outra forma, embora compiladores antigos ou com configurações selvagens permitam fazer estragos, e claro, com um cast tudo é permitido, mesmo que o resultado seja ruim.
O ideal é usar funções com assinaturas compatível, é comportamento indefinido usar uma inadequada, como demonstrado em uma das linhas.
As duas funções com nome x
possuem a mesma assinatura, que é compatível tanto com a soma
quanto a sub
definidas mais abaixo. O typedef
é compatível com a mesma assinatura. Os nomes poderiam ser diferentes, porque no fundo isso é apenas o nome da variável. As com nome fn
possuem outra assinatura.
Uso
A vantagem de ter isso é que podm configurar dinamicamente o que executar em determinado contexto. Que é o tal do polimorfismo (pelo menos uma forma dele). E é um substituto do if
em muitos casos, já que as funções podem ser colocadas em uma vetor ou outra estrutura de dados, como demonstrei acima no exemplo. Então sempre que alguma ação precise configurada sob demanda, conforme a necessidade do momento, este tipo de função é interessante.
É muito usado como callback, onde você chama um algoritmo que em determinado momento precisa executar algo que ele ainda não sabe o que é, ou seja, ele responde a algo configurável pelo chamador. Então pense em handlers, events.
O próprio C tem algoritmos que esperam um callback, por exemplo o qsort()
onde você diz como ele deve executar a comparação de dados para classificar da forma como deseja, portanto pegando o dado específico, decidindo se fará algo operação extra com o dado, como por exemplo dar um upper, se será crescente ou decrescente.
A criatividade permite fazer composições diversas, poderia por exemplo criar um dicionário com (ponteiros para) as funções como valores dele e de acordo com algo digitado pelo usuário ou obtendo a informação de outra forma em tempo de execução chamar a função adequada, o que é muito parecido com o que uma linguagem com bastante dinamicidade e tendo um eval()
permite fazer.
Se for algo estático pode ser uma jump table.
Uma aplicação como é a chama lazy evaluation, onde você define o que deseja fazer, mas não quer que seja feito naquele momento, então você "passa o código" para algum lugar e no momento adequado o código é chamado.
Limitação
C não possui sintaxe de lambda que poderia declarar a função no local que precisa. Algo assim não pode:
printf("%d\n", tabula((int x, int y) => x + y, 20, 5));
C também não tem um mecanismo próprio de captura de váriaveis do escopo atual para carregar junto com a função passada como parâmetro, algo que outras linguagens possuem, mas nada impede de você criar manualmente essa capacidade, só não é conveniente.
Exemplo
O exemplo mais óbvio de uso é com algoritmos de classificação onde precisa dizer qual é o critério do que é menor do que o outro, até para decidir a chave exata ou se a ordem deve ser crescente ou decrescente. Por isso a função qsort()
padrão do C já recebe uma função como parâmetro. Em C++ isso é muito mais eficiente.
#include <stdio.h>
#include <stdlib.h>
int compare(const void* left, const void* right) { return (*(int*)right - *(int*)left); }
int main() {
int (*cmp) (const void* , const void*) = &compare;
int array[] = {1, 8, 0, 4, 6, 5, 1, 6, 9, 7};
qsort(array, 10, sizeof(int), cmp);
for (int i = 0; i < 10; i++) printf("%d ", array[i]);
}
Veja funcionando no ideone. E no repl.it. Também coloquei no GitHub para referência futura.
Exercício: isso gera uma classificação estável? A pergunta é uma pegadinha.
C++
Este mecanismo não deveria ser usado em C++, a não ser por compatibilidade, há muito tempo ela tem bibliotecas que lidam com isso de forma melhor, e desde 2011 possui lambdas e closures. E até alguns usos específicos o C++ tem solução melhor.
Assembly
Veja como fica depois de compilado pelo GCC (outros compiladores são, teoricamente, menos eficientes):
push rbp
mov rbp, rsp
mov DWORD PTR [rbp-4], edi
mov DWORD PTR [rbp-8], esi
mov edx, DWORD PTR [rbp-4]
mov eax, DWORD PTR [rbp-8]
add eax, edx
pop rbp
ret
func:
push rbp
mov rbp, rsp
mov esi, 5
mov edi, 20
call soma
pop rbp
ret
func2:
push rbp
mov rbp, rsp
sub rsp, 16
mov QWORD PTR [rbp-8], rdi
mov rax, QWORD PTR [rbp-8]
mov esi, 5
mov edi, 20
call rax
leave
ret
tabula:
push rbp
mov rbp, rsp
sub rsp, 16
mov QWORD PTR [rbp-8], rdi
mov DWORD PTR [rbp-12], esi
mov DWORD PTR [rbp-16], edx
mov ecx, DWORD PTR [rbp-16]
mov edx, DWORD PTR [rbp-12]
mov rax, QWORD PTR [rbp-8]
mov esi, ecx
mov edi, edx
call rax
leave
ret
main:
push rbp
mov rbp, rsp
mov edx, 5
mov esi, 20
mov edi, OFFSET FLAT:soma
call tabula
mov eax, 0
call func
mov edi, OFFSET FLAT:soma
call func2
mov eax, 0
pop rbp
ret
Melhor visualmente no Compiler Explorer.
Dá para notar que a chamada sofre indireção e possui instruções mais complexas. O que talvez não seja tão óbvio é o acesso extra à memória e isto sim pode ser mais lento e faz mais diferença que algumas instruções a mais. E dá pra ver que tudo que é definição de tipos e contratos é jogado fora.